sábado, novembro 01, 2003

Bactéria Blog


Fractalidade

Para o mais observador e para o amante de toda a ciência, esta é uma pergunta que mais tarde ou mais cedo acabarão por fazer: o Universo parece repetir-se, em diferentes escalas, ad infinitum, será que isso acontece desde o infinitamente pequeno ao infinitamente grande? Tem sido exactamente sobre esta temática que o OzOnO se tem debruçado já há algum tempo, tendo A Metamorfose comentado esse aspecto recentemente.

O assunto, para mim, não é novo. Já me questionei bastante sobre isso e também já discuti com várias pessoas. No entanto, já não o faço há algum tempo. Tendo em conta a constante obtenção de conhecimento, a evolução de conceitos e a maturação de raciocínios, julgo que se impõe nova reflexão.

Basicamente, um Universo como o descrito por uma repetição infinita, nas diferentes escalas, é um que tem um comportamento fractal. A matemática tem estudado essa área já há muito tempo, mas ainda é uma onde, mesmo actualmente, se continuam a verificar evoluções. Com o advento de toda a era da computação, tem sido possível agora aos matemáticos colocar em prática e visualizar as mais recentes teorias e pesquisas, coisa que antes seria impossível de fazer.

Eu trabalho diariamente com o infinitamente pequeno, vivo numa escala média (como todos nós) e sou um amante do Universo como um todo (mais precisamente da área da astrofísica). A minha opinião é a de que o Universo não é fractal. Na realidade apresenta imensas características pontuais de fractalidade, das quais o exemplo das nervuras de uma folha de plátano, ou a disposição dos seus ramos (como foi referido no OzOnO), são belos exemplos. Na realidade, o comportamento fractal encontra-se em sítios que nunca imaginaríamos que pudesse existir.
No entanto, a noção de escala está bem impressa no Universo. Ainda há pouco tempo se falou dos limites do Universo. Logo aí se está a truncar a progressão, teoricamente infinita, que este deveria ter. Claro que podemos sempre afirmar que depois do nosso Universo se encontra um outro e que eles próprios serão constituintes de um outro Universo a uma escala superior. Quanto a estas teorias, não poderei afirmar se são válidas ou não (nem julgo que alguma vez venha a ser possível afirmá-lo). No entanto, sei que, para já, se está a impor uma delimitação que, caso o Universo seja puramente fractal, terá de ser verificada em todas as outras escalas. Essa seria uma limitação principalmente geométrica. Mas não é preciso seguir por aí. Basta notar que as leis físicas actuam de formas muito distintas em escalas diferentes, e só por aí já se corta a progressão fractal do Universo. Temos, por exemplo, a força nuclear forte, que mantém os nucleões íntegros através da troca de partículas de campo, de elevadíssimas massas, entre os seus quarks constituintes. Temos o facto de esta força aumentar com a distância entre os quarks e o seu comportamento é tal que, caso tentemos separar dois quarks de um mesão, mais tarde ou mais cedo a força torna-se de tal forma forte que já há energia suficiente para criar mais dois quarks. Assim, de um mesão, fornecendo energia, formam-se dois mesões (é este facto que nos impede de alguma vez encontrarmos um quark isolado na natureza). Em total oposição, temos a força electromagnética, que diminui com a distância, actua a escalas totalmente distintas e afecta características das partículas também distintas. E se fossemos assumir a gravidade como sendo uma força, então teríamos algo ainda mais distinto.
Para além das forças, temos também o comportamento ondulatório da matéria, que varia enormemente com a escala. Daí se verificarem efeitos ondulatórios à escala atómica, mas praticamente vivermos num mundo em que esses efeitos são, basicamente, inexistentes.

Já ouvi muita gente a comparar o átomo, com o sistema solar, com as galáxias, e por aí adiante. A mim parece-me óbvio que certas geometrias, certos comportamentos, são obviamente mais favoráveis que outros. Um desses é a circunferência (nas trajectórias) ou a esfera e os seus parentes ligeiramente distorcidos (ovais e ovalóides). Ao nível matemático, a esfera, por exemplo, é a forma que permite a todas as partículas constituintes manter uma distância média em relação a todas as outras, mais pequena. Numa situação de atracção entre todas elas, então será mais favorável esta e isto vai ocorrer em qualquer escala. Por isso os núcleos dos átomos têm tendência a serem esféricos e os planetas também. No entanto, a força e as características verificadas num caso e noutro são muito distintas. Não devemos confundir similaridades de algumas características com um comportamento fractal. Este é muito interessante, mas não conta a história completa do nosso Universo. Existem imensas situações de recorrência, mas não são mais do que isso, situações.

Escrito por Hugo S. @ 10:23